New Directors | New Films
Cineasta do Mês: Tobias Nölle
18.01.2017

A Europa entrou em 2017 naquele que promete ser um Inverno particularmente frio, com a maior parte do continente com ventos polares, nuvens escuras e inúmeros metros de neve e de nevoeiro. Felizmente, há pessoas que não têm qualquer problema em encontrar a luz no meio de todo este nevoeiro e, ainda melhor, têm as aptidões necessárias para encontrar calor neste gelo. Os afortunados a terem encontrado o maravilhoso mundo estranho e misterioso de “Aloys”, uma das mais excitantes longas metragens de 2016, saberão exactamente do que estamos a falar. É o trabalho de uma das novas figuras mais talentosas e prometedoras do circuito cinematográfico Europeu e é também o Cineasta do Mês de Janeiro no FEST. É altura para conhecer o realizador suíço Tobias Nölle.

Berlinale 2016. Enquanto a multidão lá fora se digladia para conseguir entrar nos novos filmes de realizadores como Denis Côté, Lav Diaz, Gianfranco Rossi, Danis Tanovic ou Mia-Hansen Love, nos corredores da indústria e da área de imprensa um rumor começa a ser fugazmente espalhado. Um “pequeno e envergonhado” filme suíço estava na ponta de muitas línguas, como se estivesse a ser espalhado um pequeno segredo e esse significasse que grandes coisas viriam. O filme era “Aloys” de Tobias Nölle, a história de um introvertido detective privado, cuja sua quase total isolação é subitamente interrompida pela chegada de uma misteriosa mulher, que vira o seu universo literalmente de cabeça para baixo. O Prémio Fipresci dentro da prestigiosa secção Panorama na Berlinale foi a confirmação de tal rumor e o caminho que o filme seguiu posteriormente não deixa margem para dúvida. Cinco meses depois o filme estava na ribalta na competição do FEST de 2016, onde ganhou o Prémio Golden Lynx e histórias muito semelhantes aconteciam em festivais como o Cameraimage ou o Las Palmas Film Festival.

Não é acidente nenhum que dentro do circuito dos festivais, a visão fresca de Nölle sobre a alienação urbana e a atmosfera melancólica que cria nos seus mais recentes trabalhos tocasse tão profundamente nas pessoas. “As minhas personagens estão a lutar contra as paredes do isolamento ao extremo, mas no fundo, os seus sentimentos são os nossos. Acredito que às vezes todos nos sentimos sozinhos e desconectados, talvez mais do que o que gostaríamos de admitir. As mudanças na sociedade moderna, os meios de comunicação digitais e a mudança para um mundo virtual afastam-nos mais uns dos outros e de nós mesmos do que nos aproxima”, disse-nos o realizador.

Não é a primeira vez que Nölle escolhe explorar este tipo de temas e de protagonistas desamparados. Em 2008 desencadeou o seu primeiro sucesso, uma curta-metragem chamada “René” (que pode ser vista aqui), um retrato sobre um homem invulgar obsecado por gravar a sua própria voz em cassetes, enquanto rumina sobre a “White Land”, um lugar misterioso, no qual ele não pode entrar, mas que é influenciado pelo mesmo. O sentido da solidão e do afastamento são similares aos encontrados em “Aloys” e também o é o resultado. Ambos os filmes explorar a paisagem suíça de forma espectacular, uma visão que tem um papel central por si mesma.

“Comparado com o horizonte deslumbrante de, digamos, Nova Iorque ou LA, as torres suíças de apartamentos feias, enevoadas e cinzentas são muito mais honestas. Estão carregadas de isolação, como se fossem os rostos da solidão. Ainda assim, tento encontrar beleza e mistério nessa tristeza, como as minhas personagens, encontrar janelas nessas paredes cinzentas. Construir sonhos nestas partes perdidas e esquecidas do mundo moderno é tão fundamental, tal como comida e água para o corpo humano.”

“René” anunciou a chegada de Tobias Nölle com um estrondo, arrecadando importantes prémios em festivais como Locarno, Clermont-Ferrand ou no Tampere International Short Film Festival. Ironicamente, para um realizador tão fascinado por personagens que não partilham a mesma visão com toda a gente, ele mesmo foi apanhado desprevenido com as reações ao seu filme. “Quando terminei de editar, achei que René era a pior curta-metragem de sempre, com uma personagem estranha que ninguém compreenderia. Mas depois, todas essas pessoas apareceram, que se tinham sentido tão conectadas com este homem. Deu-me a confiança necessária que, se eu representasse o mundo estritamente pelos meus olhos, sem importar quão desconfortável ou estranho isso possa parecer, a hipótese é de que isso possa transmitir um pingo de verdade.”

 

 

Estariam perdoados por não reparar na quantidade de interessantes novos realizadores que têm aparecido, nos últimos nãos, na Suíça. Pode não haver muito brilho ou glamour no panorama Suíço, mas não há certamente falta de byzz, energia e criatividade. A quantidade de curtas-metragens suíças inovadoras que, nos últimos anos, tem abrilhantado programas por todo o mundo deveria ser um claro sinal de que uma nova geração está pronta, apta e sedenta de furar na realização de longas-metragens. Na Suíça “mais jovens realizadores estão dispostos a cometer riscos cinematográficas, para contar algo pessoal. Talvez nos estejamos a dar conta da mais simples das verdades, que mesmo que estejamos a viver num paraíso neutro, está a haver uma luta dentro de todos nós. Apesar de estarmos cheios de dinheiro, temos escuridão, humor e curiosidade. Pessoas como Frisch, Dürrenmatt, Fischli / Weiss ou Roman Signer provaram-no noutras formas de arte, porque não também através do cinema? Espero que a Suíça se transforme na nova Escandinávia, mas totalmente Suíça. O eco internacional do meu trabalho tem sido muito mais quente do que cá dentro. Mesmo assim, tenho quase a certeza de que vou conseguir fazer um novo filme. Isso é tudo o que importa.” Disse Nölle.

Foi neste contexto que o artista suíço participou na experiência instigante the “Wonderland”, uma visão conjunta sobre a condição suíça através de 10 jovens realizadores locais. “Adoro colaborações e aquilo parecia quase histórico. Baseando-me na natureza do projecto, com 10 pessoas a contarem uma história, foi uma grande oportunidade de trabalhar num universo mais convencional do que no meu trabalho pessoal. Deu-me esperança de que um dia me consiga alastrar para uma audiência ligeiramente maior do que “Aloys” ou “René”, sem perder o ponto de vista pessoal. Na verdade, o meu novo projecto já bebeu dessa experiência.”

Com “Aloys” o nome de Tobias Nölle foi subitamente projectado em terrenos mais elevados, criando muita expectativa na Europa. No entanto, apesar do sucesso, o realizador rejeita a ideia de que se tornou de certa forma numa estrela. “Estás a brincar? Sinto-me o oposto de uma estrela. Continuo a tentar fazer um bom filme. Tive a oportunidade de criar o meu próprio universo e de o encher com pessoas e emoções que queria abordar e depois houve outras pessoas que gostaram realmente disso. E outras que não. Tão simples como isto.”