A 18º edição do FEST trouxe a Espinho grandes nomes do cinema mundial. Gael García Bernal foi um dos principais destaques do programa de indústria deste ano. De uma oratória incrivelmente perspicaz, astuta e reflexiva, o ator de filmes apaixonantes como Amores Perros (2000), Y Tu Mamá También (2001) e La Mala Educación (2004), esteve à conversa com os participantes do festival sobre a sua carreira e a sua relação tanto com os realizadores com quem trabalha, como com as personagens que interpreta.
Para Gael, o realizador é o fator determinante na escolha dos seus projetos e, por isso mesmo, abriu a sua palestra expondo três tipos de realizadores que encontrou ao longo do seu trajeto. O realizador que se esconde por trás da câmara, que Gael descreve como “voyeurístico”, o realizador híbrido, e o realizador que despeja todo o seu corpo e alma na sua obra. Neste último tipo, diz Gael, inserem-se nomes como Michel Gondry, com quem trabalhou em La Science Des Rêves (2006), e o seu amigo de longa data Alejandro González Iñárritu - o realizador por detrás de Amores Perros, o filme que lançou a carreira do ator, e de Babel (2006).
A filmografia de Gael é extensa e de grande qualidade, permitindo desenhar uma imagem bastante completa da relação ator-realizador em todo o tipo de cenários. Em Y Tu Mamá También de Alfonso Cuarón, por exemplo, os ensaios foram longos, mas em Ema (2019) de Pablo Larraín, Gael chegou ao dia de filmagens sem ainda ter lido o guião. Diarios de motocicleta (2004), de Walter Salles, permitiu-lhe encarnar um ícone político mundial em Che Guevara, enquanto que o caráter meta-cinemática de La Mala Educación de Pedro Almodóvar lhe deu a oportunidade de interpretar uma personagem dentro de outra dentro de outra.
“As minhas personagens são o meu património,” Gael explicou. A sua abordagem à arte de representar é romântica sem nunca deixar de ser prática. A sua paixão pela sua profissão é clara através de todo o seu discurso e defende-a com unhas e dentes. Detesta realizadores que culpam o falhanço dos seus filmes nos atores e considera a fama o “mais estranho dos animais”.
Convicto nas suas ideias, Gael procura escolher projetos com um propósito, acreditando que a política, no seu modo mais amplo, sempre fez parte da sua vida enquanto latinoamericano. Por isto mesmo, assume sempre uma perspetiva sociológica e antropológica perante as personagens que representa.
A masterclass de Gael terminou com uma mensagem de esperança face ao papel do cinema num mundo cada vez mais caótico e urgente. O Centro Multimeios de Espinho ovacionou o ator, que retribuiu o entusiasmo. “Vamos repetir, afinal somos atores, não é?” disse, pedindo ao público que repetisse a ovação para que ele, agora levantado, o pudesse aplaudir de volta.
Francisca Tinoco