New Directors | New Films
Cineasta do Mês: Maximilien van Aertryck
17.11.2016

© Isak Bodin Alfredsson

 

É extraordinário ver como os documentários têm evoluído na última década. O que muitos consideravam uma arte menor está a conseguir progressivamente entrar no circuito mainstream e nenhum evento de cinema pode passar sem um foco considerável neste formato. O FEST não é uma excepção e, à medida que novos estilos de documentário vão surgindo a um ritmo quase frenético, assistimos também ao surgimento de novos talentos que revelam uma enorme capacidade de ultrapassar as barreiras convencionais e elevam o documentário. Em Novembro, o nosso destaque de Filmmaker of the Month recai num novo talento do formato documentário, um francês que quebra o estereótipo: Maximilien van Aertryck.

 

Em 2012, numa altura do ano em que estávamos submersos num mar de submissões de filmes, o nosso “navio” foi inesperadamente sacudido. Não embatemos num iceberg ou pelo menos não um iceberg no sentido tradicional. O nosso choque foi com uma curta-metragem documental chamada “Icebrakers”, um olhar sobre as vidas mundanas dos passageiros de um ferry e sobre a batalha deste monstro de ferro, contra os elementos gélidos que encontra na viagem. Uma sensação estranha marcou o filme, um poderoso contraste entre os adolescentes bêbados que procuram divertir-se enquanto navegam numa armadilha gigante. O primeiro filme de Maximilien van Aertryck foi obviamente seleccionado para aquela edição do FEST, numa revelação posteriormente confirmada, comprovando que o caminho para o documentário é tanto de observação como de desafio da realidade aparente.

 

Still: Icebreakers 

 

"Comecei com o documentário porque pensei que conseguiria ter acesso e observar locais que me interessavam. Também acredito que a imagem é muito forte e é um mecanismo que pode criar referências que podem influenciar a maneira com pensamos e como nos comportamos. Pensamos que sabemos como os políticos trabalham porque os vemos a serem dramatizados nas notícias ou em séries de televisão, mas a verdade é que a realidade está a anos-luz dessa imagem. Num dos meus filmes “Second Deputy Speaker”, fui ao parlamento sueco e gravei no dia da histórica votação que visou simbolicamente mostrar resistência à extrema-direita. Quando exibi o filme, a audiência ficou surpreendida pelo quão lento, aborrecido e absurdo foi este voto. Estou interessado em capturar imagens que desafiem a percepção do mundo da audiência e que façam as pessoas reflectir sobre as inúmeras convenções que existem e que acabam por se transformar em imagens que consumimos todos os dias”, disse o jovem realizador francês.

 

Maximilien van Aertryck não é o típico cineasta francês. Apesar do conjunto invejável de novas caras que surgiram na cena, Aertryck escolheu um caminho improvável, com base na Suécia, um universo bem diferente do seu contexto natal. Maximilian disse-nos: “Na cidade onde moro, Gothenburg, existe um diálogo crítico e vibrante sobre o cinema e a indústria do cinema. A educação para cinema aqui tem, na minha opinião, algumas das opiniões e propostas mais interessantes em todo o mundo. Tenho o mesmo a dizer sobre a empresa onde trabalho, Plattform Produktion, onde estamos constantemente, através do humor e da gravidade, a examinar a forma como o cinema influencia as pessoas e a sociedade no geral. Na Suécia encontrei a energia contra-corrente ao conhecer pessoas que já fazem isto há vários anos”.

 

 Still: Matrimania

 

Desde 2014, o realizador francês tem embarcado em várias aventuras de co-realização, algo que o ajudou a desenvolver diferentes estilos e técnicas. De todas as experiências, talvez a mais ousada é o seu primeiro filme “Matrimania” (que também esteve em competição no FEST 2015), onde Maximilien e Vincent Bitaud emergiram no mundo de casamentos indianos e na sua explosão de cores e tradições. “O desafio que eu e o Vincent encontramos quando fomos para a índia para seguir um fotógrafo de casamentos durante dois meses, não foi o facto de estarmos a filmar tão longe de casa, mas a ideia de não saber onde esta viagem nos levaria e do como o filme iria ser. Fomos para Índia com ideias pré-concebidas de como o país e a sociedade em si seriam e queríamos que o filme refletisse o nosso encontro com a realidade. Foi uma grande aposta que se baseou na nossa observação e em situações interessantes que foram surgindo. Ficamos bastante contentes com o resultado final. Foi um grande exemplo de como o formato documentário nos pode levar a sítios que nunca experienciamos antes”.

  

Desde então têm havido poucos limites no caminho de Maximilien van Aertryck, tendo alcançado o seu ponto mais alto este ano, com uma das suas curtas-metragens “Ten Meter Tower”, seleccionada para competir na prestigiada Berlinale. A experiência de tomar o centro do palco num evento cinema tão reconhecido, é mais do que uma afirmação do seu talento, é sinal de que grandes coisas estão ainda para vir: “A Berlinale é o maior festival onde tive oportunidade de apresentar um filme meu. Teve nada menos do que cinco exibições numa semana, em que as salas estiveram sempre cheias. É também um festival que não faz grande distinção entre curtas e longas metragens, mantendo o foco no conteúdo. A visibilidade que a Berlinale nos deu, permitiu-nos continuar a exibir o filme pelo resto do mundo”.

 

Maximilien na Berlinale

 

Depois deste impulso, não existe escassez de projectos para o futuro. “Eu e o meu co-realizador Axel Danielson (com quem fiz o “Ten Meter Tower” e outros três filmes nos últimos dois anos) estamos a trabalhar na nossa primeira longa-metragem documental juntos. Tivemos permissão para gravar as câmaras do estúdio da SVT, a emissora de serviço público nacional sueca, em directo, nos seus vários programas. Estamos interessados no contraste entre o que acontece quando as câmaras estão ligadas e o programa está a ser transmitido em directo e em como toda a gente se comporta quando isso acaba. Este ano realizamos uma curta-metragem chamada “Because the world never stops” que foi gravada na redação de notícias da SVT, que nos ajudou a desenvolver o conceito para esta próxima longa-metragem.

 

Still: Ten Meter Tower